sábado, 6 de dezembro de 2008

O rei!

Era o sétimo filho de João e Maria. não bastasse isso. tinha vindo fora de época. cresceu sozinho. sem muitos amigos. dentro do barraco de madeira. na periferia do Rio de Janeiro. Estudou só até a quarta série. e logo começou a trabalhar. a mãe que era cozinheira de uma família rica. e o pai que era porteiro de um prédio no Leblon. nem percebiam no que ele se transformava. no meio do seu novo emprego. era conhecido como bolinha. não porque fosse gordo. mas por ser tão magro e ter pernas finas. avião. era esse o seu cargo. subia aqueles degraus turvos dia e noite. ganhava alguns trocados. depois dava um tapa de noite. nunca fora pego. e sempre quis ser como o chefe. esse era moreno. alto. e forte. conhecido pelo nome de O grande. era temido. e tinha algumas mulheres.
- Pô Grande, quero ser assim, como você!
-Tá querendo me tirar da parada muleque?
-Não... não...sou brother, mano!
Foi assim que ele cresceu. sem muitos sonhos. mas com um projeto. seria o chefe um dia. conhecia todos os rivais. e sentia ódio deles. mesmo sem nunca ter visto nenhum de perto.
alguns anos passados. agora bolinha já era segurança do chefe. cuidava dos embaladores. quem não ficasse esperto. tomava uma bala. na cabeça. ele parecia não ser gente. não tinha pena. não tinha laços. tinha algumas paixonites. mas nada demais. tivera quatro filhas. antes mesmo de completar vinte e um. a mãe agora aposentada. pedia. implorava. para que ele procurasse emprego. assinasse carteira. saisse daquela vida. mas ele era bom naquilo. não sabia fazer mais nada. ou pelo menos acreditava nisso.
- Bolinha, te prepara, amanhã vai ter festa no morro.
-Sussa brother...eu apareço.
a festa não era funk. nem envolvia pessoas felizes. dançando e cantando. falavam de tomar o ponto da esquina de baixo. que era usado para a venda de drogas. e estava tomado pelos alemães. seria uma guerra. perigosa. e estava sendo planejada há algumas semanas. o horário marcado era às onze. e Bolinha. começou a se preparar. primeiro comeu um prato de arroz feijão. com um grande ovo em cima. depois colocou a bermuda azul já desgastada. pegou Mariana. sua arma de estimação. colocou um boné vermelho. e foi. cheio de si. sem medo. nem receio. seria rei naquela noite. comandaria tudo.
o tiroteio começou na hora marcada. as pessoas que estavam no bar do mineiro. que era na frente da tal esquina. começaram a correr e se abaixar. os alemães não tiveram muita reação. foram pegos de surpresa. e estavam em número menor. a conquista foi mais fácil do que havia imaginado. logo que percebeu a desistência do adversário. subiu na mesa. e gritou que era rei.
-O ponto é nosso, seus merda!!!
no outro dia. as pessoas desviavam dele no morro. abaixavam a cabeça. mostravam respeito. era rei. tinha conseguido. com apenas vinte anos. era o maior dos homens no morro. à noite foi até o bar do zé padoca. pediu uma cerveja. e contava piadas para os companheiros. quando ouviu um barulho. que pareciam tiros. levantou. olhou. e pediu para que se preparassem. ele iria ver o que estava acontecendo. desceu pelas vielas. como um fantasma. conhecia cada canto daqueles becos. de repente. em uma das esquinas. viu os alemão.
-Viados... catando meus laranja!
num salto para o lado. deu o primeiro tiro. e correu para outro canto.estavam em muitos. parecia um exército. e ele. o rei. sozinho.
-Ahhh seu merda- disse o traficante do morro vizinho- num treme não. tu vai morrer viado.
-errou. seu merda. quem vai morrer é você!- disse bolinha.
e num jingado de corpo. se virou e atirou. acertou a perna do inimigo. os outros meteram bala nele. tomou mais de quarenta tiros. morreu ali. com sua companheira inseparável Mariana. os alemão sumiram. e quando os homens de Bolinha chegaram. pegaram o corpo dele. carregaram até a porta de Maria e João. tocaram a campainha. já passava das onze. ficaram esperando alguém sair.
-Meu Deus...-levou as mãos na boca. e amoleceu as pernas. Maria não queria acreditar que era Marcelo. o bolinha.
-Desculpa. não pudemos evitar. aqui está mariana- disse de cabeça baixa o Grande.- ele morreu como herói do morro.
-filho. eu te falei tanto pra procurar um emprego.- segurou a cabeça dele. como se tentasse fazê-lo acordar- agora é assim que você chega em casa.
a dor da mãe era sofrida. sentia-se culpada. por não ter evitado. não ter feito ele estudar. e ser alguém. no fundo talvez soubesse. que a culpa nãe era dela. nem de João. que se mantinha firme naquela hora. mas do mundo. que algumas(muitas) vezes. se ausentou. fechou os olhos. assim como eles. que eram os pais. como ele poderia estudar. se mal tinha comida em casa. e como seria alguém. se lutara a vida inteira apenas para ser o rei do morro.

6 comentários:

D.Ramírez disse...

Primeiro me veio AMEM..depois me veio pra que..depois me veio e me veio e nada veio.
Seu texto está acima de qualquer comentario meu, pq nao tenho essa vocação de comentar algo que está acima do que sei, no sentido literário.
Só me resta admirar e aplaudir, pq comentar nao saberia, mas sei oque é bom.
Besos

meus instantes e momentos disse...

eu só queria ter a metade da disposiçaõ que vc tem de escrever.
Muito bom o texto.
Ótimo teu blog, gosto daqui,
maurizio

Olavo disse...

Que maravilha..nossa perfeito..vc é boa nisso em!!Parabens.
belo texto..o blog bom de se ler..
beijão

Germano Viana Xavier disse...

História real-perto.
Lugar de sempre nos olhos já maculados da gente. Rotina que mata e não perdoa.

Leio e surgem imagens.

Um carinho, Jaque.
Continuemos...

Olavo disse...

Tem um selinho para você lá no blog
beijão

Germano Viana Xavier disse...

Passando por aqui e relembrando, Jaque.

Um carinho de quarta-feira.
Continuemos...